Por Psicólogo Valcrezio Revorêdo CRP 17/4661
Vivemos em uma era digital onde as redes sociais se tornaram um espelho virtual de nossas vidas, refletindo não apenas momentos de alegria e conquistas, mas também uma infinidade de comparações. A facilidade com que podemos acessar as vidas alheias gera um terreno fértil para o hábito perigoso de nos compararmos constantemente aos outros. Embora a comparação possa ter suas raízes na busca por referências, os perigos associados a essa prática merecem uma análise cuidadosa.
Comparar-se aos outros nas redes sociais é um fenômeno comum, mas os riscos estão além da mera observação. A psicologia explora profundamente os efeitos da comparação nas redes sociais. O ato de comparar-se aos outros é inerentemente humano e pode ter raízes evolutivas. No entanto, em um mundo digital, a exposição constante a padrões inatingíveis pode distorcer a percepção da realidade e levar a uma busca implacável por validação social. As pessoas podem começar a medir seu próprio valor com base em métricas externas, como número de curtidas, seguidores ou conquistas aparentes, criando um ciclo autodestrutivo de comparação.
Por outro lado, a psicologia também reconhece a importância da comparação como uma ferramenta de aprendizado e motivação. O ser humano tem uma propensão natural para buscar referências e aprender com os outros. No entanto, é crucial diferenciar entre a comparação saudável, que busca inspiração e crescimento pessoal, e a comparação prejudicial. A constante exposição a vidas aparentemente perfeitas pode desencadear sentimentos de inadequação, insatisfação, insegurança, derrubar a autoestima e abrir portas para o surgimento de transtornos como ansiedade e até mesmo depressão. Afinal, as redes sociais muitas vezes destacam os melhores momentos de cada pessoa, criando uma narrativa que pode ser distante da realidade cotidiana.
As redes sociais, por sua natureza de destacar apenas fragmentos selecionados da vida de alguém, podem distorcer a percepção da realidade. É fundamental desenvolver uma consciência crítica ao consumir conteúdo online, lembrando-se de que as narrativas apresentadas podem ser incompletas.
A psicologia aconselha a cultivar a autoestima e a auto aceitação, reconhecendo que cada jornada é única. Entender que as comparações nem sempre refletem a realidade completa e que o valor de uma pessoa não é determinado por sua posição em uma escala imaginária de sucesso é essencial para preservar o bem-estar mental.
A fenomenologia existencial, uma corrente filosófica que busca compreender a experiência subjetiva do indivíduo, afirma que quando nos comparamos a outros, muitas vezes caímos na ilusão de que podemos alcançar uma forma de completude ao adotar características, conquistas ou aparências alheias. A filosofia existencial alerta que essa busca por uma “completude ilusória” pode nos afastar de nossa autenticidade, levando-nos a uma jornada desconectada de nossa própria singularidade.
Jean-Paul Sartre, um proeminente filósofo existencialista, destacou a importância de reconhecer a liberdade radical que cada indivíduo possui. Ao nos compararmos, corremos o risco de negar essa liberdade, aprisionando-nos em padrões externos que não refletem nossa verdadeira natureza.
A comparação incessante também pode levar à desumanização, pois reduzimos nossa existência a um conjunto de métricas mensuráveis. A fenomenologia existencial salienta que cada pessoa é um “ser-para-si”, um indivíduo único e irrepetível. Comparar-se a outros pode transformar essa rica experiência em uma busca vazia por validação externa, privando-nos da riqueza intrínseca de nossa própria existência.
O Desafio de Abraçar a Autenticidade
Ao invés de se perder na miragem da comparação, a fenomenologia existencial nos encoraja a abraçar nossa autenticidade. Martin Heidegger, outro expoente dessa corrente, argumentou que a verdadeira compreensão de si mesmo emerge quando nos voltamos para nossa própria experiência e abraçamos a responsabilidade pela nossa existência.
Em última análise, as redes sociais são ferramentas poderosas que podem tanto inspirar quanto prejudicar. A chave reside na consciência individual sobre o propósito da comparação e na habilidade de discernir entre aspirações saudáveis e expectativas inatingíveis. A psicologia nos lembra que, embora as referências sejam necessárias para o crescimento, a jornada pessoal é única, e a verdadeira medida do sucesso reside na autenticidade e na realização pessoal, não em comparações superficiais.